Ser especialista numa área onde o cliente tem uma enorme experiência, conhecimento e intuição não é tarefa fácil. Vejamos primeiro alguns casos onde isto não acontece. Por exemplo, na Medicina. É verdade que o doente pode fazer perguntas sobre a doença, mas se um médico diz para tomar certos medicamentos, ou para fazer certos exames é muito provável que a pessoa siga as suas indicações, sem grande resistência. O mesmo se passa no Direito. Aquilo que o advogado diz para ser feito é, por norma, pouco contestado. Talvez os pormenores possam ser discutidos, mas é ele que conhece as leis e, consequentemente, é ele que dita qual o caminho a seguir.
Na área da gestão das empresas, o cenário é outro. O cliente tem uma enorme experiência na área, intuição e até conhecimento. Qual a probabilidade de este estar totalmente aberto a ideias muito distintas? Qual a probabilidade de haver um enviesamento da realidade que condiciona a direção da solução mais adequada? Todos sabemos o quão difícil é vender uma ideia na área da gestão, mesmo que até seja uma ideia interna isto é, um chefe funcional querer implementar algo no seu próprio departamento. Por que razão isto acontece?
Vamos partir de três premissas sólidas para mostrar as relações de causa e efeito do problema:
Parece razoável assumir que qualquer um destes pressupostos são ‘factos da vida’. Os dois primeiros são considerados neutros e o último deve até ser visto como positivo. Neste sentido, quais serão os efeitos provenientes destes ‘factos da vida’, isto é, que previsões poderemos antecipar? Se juntarmos a premissa 1 com a premissa 2, então o efeito inevitável será:
Fig. 1. Efeito previsto quando 1 e 2 estão presentes
Do mesmo modo podemos juntar as premissas 1 e 4 para obtermos um outro efeito, o efeito 5:
Fig. 2. Efeito previsto quando 1 e 4 estão presentes
Podemos desenvolver o efeito 5 no próximo efeito imediato: se a maioria das pessoas é constantemente exposta a ideias que não são geniais, então inevitavelmente, “6. É muito provável que essas ideias não tragam nada de muito novo (podendo até ser prejudiciais)”. E, se é muito provável que essas ideias não tragam nada de muito novo (podendo até ser prejudiciais) então “7. A predisposição para se ouvir (mais e mais) novas ideias não é muito grande”.
Vamos verificar este último efeito connosco: quanto tempo damos a uma pessoa para explicar a sua ideia sem que esta seja (quase logo) interrompida? Não muito tempo, certo? Avancemos então no raciocínio: se a experiência da maioria das pessoas aponta para o lado oposto às ideias geniais (caso contrário essas mesmas pessoas já teriam tido tais ideias), o que acontecerá se juntarmos isto aos efeitos 3 e 8? O efeito 8 é uma dedução direta da entidade 1. Vamos desenhar a causalidade:
Fig. 3. Efeito previsto quando 3, 7 e 8 estão presentes.quando 7 ou 9 estão presentes
Ou seja, vender ideias inovadoras é muito mais difícil. Veja-se o clássico da teoria da relatividade de Einstein ou as startups de sucesso que muitos diziam que não iriam funcionar. Não admira que tanto o efeito 9, como o efeito 7 conduzam a algo que nos é bem familiar:
Fig. 4. Efeito previsto indesejável (UDE) quando 7 ou 9 estão presentes
Recuperemos o efeito 6 e o efeito 9. Ambos devem ser usados para corroborar todo este raciocínio (qualquer um deles está claramente a levar ao efeito 13):
Fig. 5. Efeito previsto quando o efeito 6 ou o efeito 9 estão presentes
Naturalmente que a partir daqui se entra num loop porque se as empresas não se evidenciam entre elas então “14. A maioria das empresas procura (ardentemente) por algum tipo de vantagem”. E, se isto é verdade e as empresas são constituídas por pessoas, então volta-se ao facto 3 que é: “A maioria das pessoas luta por uma situação melhor”.
Como sair deste loop? A direção da solução encontra-se no efeito 9: “Sempre que a ‘a venda’ da ideia genial não é feita nos moldes corretos…”. Isto pressupõe que existe um processo de venda específico para ideias particularmente geniais. E, mais em concreto, para ideias geniais que são contraintuitivas e que levam à mudança de paradigmas (ao contrário de ideias tecnológicas ou ‘gadgets’ onde a maioria das pessoas consegue ver, quase de imediato, se elas funcionam ou não).
Pode-se ‘pôr o pé na porta’ a partir de workshops que ajudam a mudar ‘as lentes’ de como se olha para o mundo, através de causalidades, jogos, simulações, estudos de caso e analogias. As mudanças de paradigma não acontecem da noite para o dia, mas por certo que é sempre uma mais valia investir um dia a desafiar pressupostos e a ‘matar’ vacas sagradas1. Ninguém disse que iria ser fácil, mas obter uma decisiva vantagem competitiva também não é para todos
1Vacas sagradas dão ótimos bifes – Eli Goldratt.